sábado, 19 de janeiro de 2013

Decisões complicadas

Desde o meu último artigo, Vercauteren saiu – mais que uma boa decisão, foi uma decisão que corrigiu uma anterior que o não foi: a sua vinda. A sua saída foi antes a decisão lógica, ou a decisão necessária. Até aqui, tudo normal. Entrou, para o seu lugar, Jesualdo Ferreira – que assumiu a função. Até aqui, tudo normal para todos. Ou quase.
 
A equipa vai aumentando, aos poucos, a sua qualidade de jogo e competitividade - os resultados vão acompanhando essas mudanças. Não me admiraria, igualmente, que a equipa continue a evoluir semana a semana, atingindo níveis exibicionais e resultados condizentes não com aquilo que são os seus objectivos para o que falta da temporada (chegada à Europa) mas até com aquilo que é a qualidade própria de quem tem objectivos maiores – discutir o título, talvez; seguramente estar no pódio, pelo menos.
 
O Sporting tem jogadores para pelo menos isso e Jesualdo Ferreira é suficientemente bom naquilo que um treinador tem de ser bom para o almejar – e para o conseguir.
 
Mas isto não leva a que considere esta mudança positiva. Ou melhor, é-o apenas na medida em que o cenário é hoje melhor que anteriormente (sabemos todos que era péssimo); não o é estruturalmente, para mim – não considero que seja uma solução suficientemente próxima da ideal (que, essa, será sempre utópica). Não só esta mudança não teria sido a minha, como, respeitando-a, a acho um equívoco que trará problemas para a organização do futebol no futuro. E vou explicar porquê.
 
Jesualdo Ferreira chegou ao Sporting com uma função que não é de todo desconhecida (já existiu no Passado existe actualmente no Sporting noutras áreas do futebol – futebol formação) mas que é pouco usual no futebol sénior dos clubes. E será talvez ainda menos usual ser publicamente assumida. Mas não é, como aliás disse no artigo anterior, uma função errada. É uma função que faz sentido, um modelo de gestão que se percebe mas que foi implementado num contexto complicado. Possivelmente, Vercauteren limitou (e com naturalidade) as funções de Jesualdo, o que levou a que os comportamentos da equipa de futebol continuassem inalteráveis. Mas o ponto que aqui queria referir é que Jesualdo chegou ao Sporting para ser o homem forte do futebol e ter autonomia de decisões sobre todo o futebol. Teve predefinida uma abrangência enorme: não só teria como função delinear os rumos do futebol do Sporting, como também poderia interferir na implementação prática desses rumos. Pelo menos, assim me pareceu.
 
Não me pareceu que tivesse vontade de vir ser o treinador-principal da equipa. E não me parece que, tendo um poder deste nível, fosse interessante colocá-lo no lugar de treinador principal. Por isso pensei, no momento em que se percebeu que a continuação do treinador belga era um entrave à evolução da equipa, que fosse essa a escolha: Jesualdo, como elemento com um poder alargado e abrangente sobre o futebol do SCP, escolheria um treinador da sua confiança, que cumprisse os requisitos que considera fundamentais, acordando com ele trabalhar da forma que havia idealizado fazer com Vercauteren (e que não chegou a existir, porque a equipa não mudou, nem para melhor – como era provável acontecer – nem sequer para pior – como era pouco provável, mas ainda assim, enfim, possível…).
 
Ora, para mim, a mudança de cargo de Jesualdo Ferreira traz um problema – por mais que cumpra os requisitos necessários para um treinador principal, e por mais que seja um individuo que continue a ter o mesmo elevado nível de conhecimento e entendimento do futebol, as suas funções anteriores ou ficam esvaziadas (isto é, deixa de haver no Sporting alguém que pense o futebol de uma forma global e abrangente) ou continuam em si depositadas, agora enquanto treinador principal da equipa sénior. Nenhuma opção me parece boa – o Sporting precisa de alguém que pense o seu futebol (ainda pudesse não ter a interferência que JF contava ter na implementação prática, no dia-a-dia, do que idealizava – seria talvez até aconselhável que assim fosse) e esse alguém não pode ser o treinador principal da sua equipa sénior. Melhor dizendo: poder claro que pode, mas não deve.
 
A minha solução seria portanto Jesualdo Ferreira escolher um treinador da sua confiança para substituir Vercauteren e definir a partir daí se alguns pormenores (ou pormaiores) das suas anteriores funções se manteriam ou não – refiro-me aqui à tal intervenção directa e prática no dia-a-dia do futebol do clube. As ideias gerais, porém, permaneceriam sempre inalteráveis - Jesualdo manter-se-ia como o grande estratega (directo ou indirecto, por assim dizer) do abrangente futebol do Sporting, porque o Sporting necessita de quem o faça exclusivamente e profundamente, e porque haveria para o cargo poucas opções melhores que si próprio.
 
Jesualdo não durará sempre e o seu legado no Sporting será bom em campo, mas temo que circunstancial – assim que decida terminar a sua carreira de treinador, o Sporting ficará provavelmente na mesma situação em que estava antes da sua entrada: não possuirá nem treinador, nem terá “ferramentas” (ou meios) para ter uma elevadíssima probabilidade de acertar nessa escolha. Não tinha de ser assim, porque o trabalho que Jesualdo poderia fazer noutro cargo, de forma exclusiva e com funções perfeitamente adequadas ao posto, poderia ter como legado um longo período de boas decisões desportivas e futebolísticas.
 
O Sporting melhorou muito, mas os bons jogos/resultados, que se avizinham, parecem demasiado circunstanciais para o que poderiam estruturalmente vir a ser.
 
PS - Os negócios de Izmailov/Miguel Lopes e Daniel Carriço. O primeiro foi um mau negócio, o segundo foi igualmente mau. Não estranho que Miguel Lopes no imediato seja uma boa solução (vem trazer à equipa o que ela não tinha) mas penso que, com o tempo, não só o CS lá chegará como irá até mais longe. E  a chegada do português implica muito provavelmente a saída de Bruno Pereirinha, que era um solução melhor (e que não seria mais cara). Relativamente a Carriço, não sei se o Sporting está a pagar o salário do Xandão (é provável que esteja) e se o Boulahrouz não tinha propostas. Não acho o segundo um mau jogador, e acho o primeiro um jogador que evoluiu muito desde que chegou (não o fez apenas nos atributos técnicos, que são fundamentais mas onde será sempre medíocre). Porém, Carriço é melhor que qualquer um. E era o capitão, também - um dos maiores símbolos do futebol actual do Sporting, pelo que é a custo que o vejo partir. 750 mil euros justificam 6 meses com Xandão em vez de 6 meses com Carriço?

1 comentário:

  1. GBC, subscrevo o teu entendimento, embora ache que o raio de influência de Jesualdo funciona nos dois sentidos. Ele poderia como Director Técnico escolher um treinador da sua confiança, mas também pode, hoje, como treinador e DT apontar ao clube um nome da sua confiança para esse mesmo cargo de DT, continuando na próxima época só como treinador. Claro as duas pessoas teriam um contacto extremamente próximo e Jesualdo continuaria, digamos, a 'mandar'. No fundo o único problema é não poder assumir as duas competências: por ser muita coisa, pelo nº de horas num dia ser limitado.
    Concordo plenamente quando dizes que é circunstancial. Ele não chega. Um clube mal dirigido pode trabalhar bem durante 2 ou 3 anos sob influência de um treinador, e pode até ganhar, mas as coisas nunca serão como deveriam ser caso os dirigentes fizessem o seu trabalho bem feito.

    Um abraço grande.

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